Com um texto muito bonito um cenário encantador e fantástico, uma direção impecável e as sensacionais interpretações, onde se aposta na inteligência de raciocínio das crianças e com a capacidade que elas tem de usar e abusar da imaginação, As Aventuras de Pinóquio vem pra poder trazer de volta o teatro clássico, de percepções rurais e muito bem segmentadas.
A primeira coisa que se vê quando se entra no teatro dos 4 é que encontramos uma maravilhosa oficina de bonecos, cheia deles pendurados por fios e nessa oficina trabalhando de forma árdua, encontramos um doce e amável velhinho que está construindo um novo boneco, ainda em fase de molde, enquanto a criançada vai chegando e se ajeitando nas poltronas, elas já reconhecem que é o Gepetto e começam a gritar, chamar pelo nome já começam a contar pros prias que ele é o pai do pinóquio. Quem faz esse "pai" maravilhoso é o ator Antônio Carlos Feio, que com uma caracterização, bem voltada ao que temos em nossas mentes, consegue idealizar um perfeito bom velhinho.
A peça nem começa e o ator já está fazendo sua encenação, ele ajeita uns bonecos, corta alguns outros, martela o próprio dedo e vai assim até dar o 3º sinal, então a peça começa e ele inicia o seu contato com a platéia, ele dança, canta em italiano Volare, as crianças já começam a rir e querem ir ao encontro dele pra abraçar e precisam ser impedidas pelos pais. chega a ser emocionante o carinho das crianças com o ator em menos de 5 minutos de convívio, ele tem o público nas mãos. Então ele começa a narrar a história que virá à seguir, sobre seu filho especial, que surgiu de um toco de Pinho (daí o nome Pinóquio, nascido do Pinho). Ele conta algumas aventuras desse boneco levado que resulta no final que todos conhecem.
Essa peça é meio que diferente, pois ela não começa com "Era uma vez" simplesmente porque quem conta tudo é Gepetto, inclusive na peça existe realmente um toco de pinho que fala e é mágico, e é ele que dará vida ao maravilhoso boneco mágico. Quem faz o Pinóquio é o talentoso ator Paulo Amaro. Seria muito fácil e cômodo pro ator fazer um homem vestido com roupas das histórias e interpretar o pinóquio como todos conhecem, porém o que é posto em prática é totalmente diferente, o ator tem preso à sua roupa um boneco feito realmente de madeira, que ele articula e contracena o tempo inteiro, o ator se resume apenas ao facial, como se fosse mudo, ele nada fala, se expressa apenas por expressões facias muito bem desenvolvidas e postas em ação, ele se anula o tempo inteiro para que as crianças prestem atenção apenas no boneco. Isso é muito bonito ver a entrega do ator que sabe se expressar por meio de sua interpretação toda como os antigos Clowns. Tudo isso tem um sentido, que não posso revelar devido ao final que eu não quero "Spoiler".
Outro que se destaca muito na peça é o jovem ator Gabriel Jaques que dá vida à vários personagens, dentre eles a raposa, o grilo, o atum e outros, as maiores cenas cômicas da peça estão creditadas à ele, que de forma simples e com apenas uns poucos acessórios e adereços ele se transforma e inteligentemente se caracteriza de bichos, bonecos ou pessoas diferentes, com expressões ricas, impostações fascinantes e gestuais muito bem pensados, o ator se desenvolve e anima as crianças, as vezes até se utilizando de coreografias simples e de fácil compreensão.
A peça ainda conta com uma participação especial de Luciana Victor, que tem como destaque uma maravilhosa boneca marionete que encanta a criançada quando entra em cena e uma maravilhosa fada madrinha que é muito engraçada e exige da atriz uma concentração mais que impressionante, é um presente especial à toda a trama.
O autor desse maravilhoso espetáculo é o genial Daniel Porto, que soube adaptar a história a um texto muito lúdico, rico e cheio de belezas e nuances, em nenhum momento a peça descamba pro besteirol, e em parte algumas as crianças são tratadas como idiotas, isso é o que faz essa peça ser considerada a maior montagem infantil do momento. A direção de Carina Casuscell é muito bem notada por nós que entendemos de marcações e de inserções, ela é muito inteligente e valoriza o que cada ator tem de melhor, seu talento, nota-se uma liberdade muito grande, mas com passadas e "deixas" muito bem afiadas.
A detalhada cenografia e os figurinos são obras do talento de Karlla de Luca, talvez por isso tudo se encaixe tão bem e adequadamente sintonizado, ela buscou tons marrons e beges que dão uma tonalidade de terra e barro, não sei se pra desenhar melhor a profissão de Gepetto, que é um carpinteiro e vive cercado de madeira, mas pra mim foi isso que me inspirou, senti que ela buscou a necessidade de representar a madeira em vários sentidos, mesmo as cores são muito leves quando surgem, nada muito gritante ou berrante.
Por fim a iluminação de Guego Lima junto com a sonoplastia de Tibor Fittel deram o toque todo especial que a atmosfera pede, sempre ao som de Acordeon ao fundo. Por sinal esse foi um detalhe muito preciso, embora seja uma história Italiana eles buscam referências no cordel e no sertão, nas "contadas" da roça e dos causos mais interioranos, tudo muito bem marcado e ensaiado.
Assistir a esse Pinóquio é fazer várias viagens, ao faz de contas, ao passado e ao mundo nordestino, uma agradável sensação com muitas surpresas e muitas coisas boas pra se ver, guardar na memória e sair feliz juntamente com as crianças, que são a principal preocupação dessa equipe fantástica e não simplesmente se mostrar ou se exibir pros outros. Parabéns à Cineteatro Produções por fazer dessa montagem algo tão mágico e inesquecível. Obrigado também à Alexandre Lino com sua direção de produção fantástica e muito bem estruturada e fiel aos contos de Pinóquio que existem e encantam à décadas.
Por João Loureiro Filho
Temporada: Até 29/03/2015 - Teatro dos 4