Paredes lascadas, rústicas, um espaço pequeno para um público que chega de forma tímida. O local ajuda na estética da montagem que cria um clima de tensão logo no inicio. A iluminação é quase sombria, mas ajuda na direção e na linha dramatúrgica do texto. Despretensiosamente “Amor Demais” chega fazendo a diferença no teatro carioca, aponta novos rumos com um texto original, novos talentos no elenco e uma direção primorosa.
O Solar de Botafogo vem se firmando como um berço de novas produções independentes que tem feito sucesso ao longo dos últimos anos. Mais uma vez Leonardo Franco acerta na escolha de um espetáculo para seguir temporada no charmoso solar.
O texto de Alexandre Maximino é intrigante, apresenta uma narrativa construída de uma forma diferente, onde o presente e o passado se encontram, junto a personagens fictícios que estão apenas na cabeça do protagonista. Essas personagens se materializam ali, na frente do público e junto a seu autor vão escrevendo, construindo seu destino, sua história. O mais interessante é perceber que o próprio drama do protagonista é que vai sendo relatado por meio das encenações. Seus devaneios, suas loucuras e suas tormentas. Até quanto ser personagem é melhor que ser vida real? A atriz que imortaliza uma obra ou a obra que é imortal e será ainda representada por tantas atrizes no decorrer dos tempos? Os questionamentos são muitos e nos fazem refletir sobre nosso papel no mundo e nossos próprios conflitos. Uma obra absolutamente imperdível.
A direção de Marcia Rocha cria imagens, propõe uma interatividade com a inserção de vídeos e abusa do trabalho com o elenco. Todos os planos são usados levando em consideração o espaço e a parceria com a iluminação de Paulo Denizot é sinônimo de sucesso.
Paulo Denizot que também assina a concepção de cenografia merece aplausos e assobios que trabalha com a delicadeza de um tempo, respeitando o texto e sendo usual. Nada está ali por acaso e tudo é utilizado nas cenas. Minucioso.
O elenco desempenha o trabalho com maestria. Todos estão de fato criveis e com suas personagens nas mãos. Apesar disso é preciso ressaltar a precisão de Telma Cunha Barros, que transita entre o drama e o humor com uma sutileza pessoal.
“Dificilmente vamos encontrar uma mãe que desiste da constância familiar para buscar preencher suas lacunas mais pessoais? Talvez sim.
Analisando as esferas familiares, percebemos que a relação mãe e filho é incondicional, chegando a anular a individualidade da mulher. O filho efetivamente tem que estar em primeiro lugar? Existe algum sentimento que ultrapasse a relação mãe e filho? Até que ponto a individualidade não pode superar a sua condição de mãe? “
O trecho acima é do release enviado pela assessoria do espetáculo. De uma forma muito natural, o texto ainda discute o amor de mãe, suas esferas, seu comportamento e as outras demais formas de amor.
“Amor Demais” é um espetáculo como poucos em cartaz no circuito carioca e merece ser visto e aplaudido de pé!