Um espetáculo rico de emoção, no qual o belo texto de David Lindsay-Abaire é o verdadeiro protagonista.
A Toca do Coelho, peça em cartaz na Sala Fernanda Montenegro no Teatro Leblon, é um belo espetáculo sobre o verdadeiro sentido da família e, acima de tudo, da vida.
Com um enredo denso, o drama que já foi sucesso na Broadway e recebeu cinco indicações ao Tony em 2006, conta com Reynaldo Gianecchini e Maria Fernanda Cândido, nos papéis de Paulo e Becca. O casal, que há oito meses formava uma família feliz, é acometido por uma perda inesperada e dolorosa do seu filho único de apenas 4 anos.
Logo quando o espetáculo começa, já se passaram oito meses da morte da criança e cada um busca seu próprio caminho para superá-la — enquanto Beca tenta apagar qualquer traço, na casa, que remeta ao filho e, é nas lembranças da criança que Paulo busca conforto para seguir adiante. O tema é grave mas a peça está longe de ser pesada, promete Dan Stulbach que faz sua estreia na direção profissional com esta montagem:
— Para mim, estamos usando a falta para, a partir dela, falar da vida. É perfeito que exista a perda para se poder falar de maternidade, de paternidade. A peça não é nada triste, ela tem humor. As pessoas passam 95% do tempo rindo e é bom que seja assim, é um espaço para extravasar.
O espetáculo possui um conceito dramatúrgico bem interessante e um conjunto cênico de uma riqueza ímpar. Destaque para bela direção de Dan Stulbach, que utiliza muito os recursos de pausa e olhar entre os atores, atitude que deixa o texto ainda mais poderoso.
Sem sombra de dúvida é o trabalho teatral mais maduro de Gianecchini. Em cena, trazendo com ele uma carga emotiva sincera e bonita de se ver. Maria Fernanda Candido compõe uma personagem simples, singela, com uma carga dramática e um tom de voz perfeito, sem deixar cair no clichê de uma mãe que sofre pela perda do filho. Os movimentos de Becca, personagem de Cândido, dá um toque todo especial ao seu trabalho. Um trabalho que merece indicações a prêmios pela simplicidade e pesquisa de movimento.
Não posso deixar de citar o leve e belo trabalho da experiente Selma Egrei emsua personagem, ela consegue carregar um excesso notório de sinceridade, trazendo tranquilidade ao espetáculo. Simone Zucato, que dá vida a irmã da protagonista, apresenta uma composição de personagem não muito criativa mas desenvolve um trabalho de voz e postura bem interessante. Já Felipe Hintze que faz o um papel chave da história, o adolescente que por um acidente tira vida do único filho do casal, faz um trabalho correto mas deixa um pouco a desejar em algumas cenas.
Já a equipe criativa do espetáculo acerta em todos os quesitos, destaque para luz, cenário e trilha. O desenho de luz de Marisa Bentivegna possui uma temperatura, textura e suavidade que transmite todo o clima da narrativa, um dos melhores trabalhos de luz cênica dos espetáculos em cartaz no circuito carioca. A cenografia de André Cortez de cores claras e suaves ilustra o realismo e ao mesmo tempo o surrealismo da trama e do sentimento das personagens, possui uma maquinaria e composição harmoniosa, principalmente quando as caixas brancas, que remete também uma toca, são “lavadas” pelas projeções que ilustra as lembranças e lado emotivo dos personagens centrais. A trilha sonora, original de Daniel Maia, é de uma sensibilidade a altura do seu texto. O figurino realista de Adriana Hitomi é simples mas um detalhe chama atenção apesar da passagem de tempo, a personagem de Maria Fernanda Candido usa um único figurino no tom cinza, que além de simbólico ajuda a compor o estado psicológico da personagem.
“A Toca do Coelho” é um belo espetáculo para quem gosta de teatro com um toque de cinema e uma trama reflexiva e de emoção pura. Sem dúvida uns dos melhores espetáculos da temporada carioca 2014.
Peça: A Toca do Coelho
Crítica por: Rodrigo Medeiros
Temporada: Março de 2014