Adubo ou A sutil arte de escoar pelo ralo

 

O sopro da morte ou O tênue e sublime fio que distingue a vida da morte.

 

“Do pó viemos, ao pó retornaremos!”

E todos viraremos o adubo que irá ajudar a cultivar um novo caminho. Não importa o que somos hoje ou quem seremos um dia, a morte enxerga a todos independente de cor, idade, sexo ou crença e, um dia, ela virá para você também. A peça “Adubo”, que estava em cartaz na Caixa Cultural, recria esse mau agouro de forma magistral utilizando-se de diferentes sentimentos e um fenomenal trabalho de corpo para nos mostrar o quão somos iguais perante o olhar da “velha senhora com a foice na mão”.

 

Através de uma mórbida e intensa excentricidade, o quarteto de atores envolvidos no projeto atravessa sua própria alma para desenvolver, em associação, um dos mais belos textos dos últimos anos, tendo como ponto de partida a morte e, de certa forma, o âmago da tragédia humana. Cada momento do espetáculo (palavra aqui utilizada como a mais pura das verdades) é crucial, transpira poesia e nos encanta profundamente.

 

O responsável pela direção é o uruguaio Hugo Rodas que causa, praticamente, uma descarga elétrica no público durante todo o tempo de apresentação. A ação desenvolvida  não se perde nem por um segundo e isso evita qualquer tipo de barriga que poderia, naturalmente, ser ocasionada em uma encenação de tal magnitude. A montagem é extremamente detalhista, leve e sincronicamente marcada, fazendo lembrar certa graciosidade encontrada na Commedia dell’arte, o que torna ainda mais fascinante as situações criadas por Rodas.

 

Juliano Cazarré, André Araújo, Pedro Martins e Rosanna Viegas são as mentes insanas, sinceras e realistas por trás de quase toda produção, consequentemente o elenco da mesma e compõem de forma harmoniosa  a proposta. É difícil falar de apenas um ator quando todos estão maravilhosamente bem em cena, e isso certamente acontece em “Adubo”.  Os quatro atores funcionam como um corpo de pessoas em uníssono. Eles pensam igual, agem e atuam de forma esplendorosa  inclusive nos momentos em que quebram engenhosamente a quarta parede. É arrebatador e significativo ver atuações tão brilhantes nos palcos brasileiros dos dias atuais.

 

A iluminação engendrada pelo próprio diretor e efetuada por Caetano Maia é essencial à obra. Trata-se de uma estética incomparável, na qual são fornecidas ao espectador particularidades sobre o enredo do que ali está sendo representado, nos impressionando a cada incidência da luz ou tonalidade utilizada para elucidar o transcorrer das cenas.

 

O cenário e figurino, ambos concebidos pelo elenco com o apoio de Sônia Paiva, nos entregam uma febril e insólita sensação de abandono, através de uma cidade vazia desenhada em um enorme quadro negro, um bar velho e sujo representado por alguns objetos de cena e/ou especificas roupas rasgadas que propõe uma apresentação desleixada e envelhecida. Embora aquelas tristes almas perambulem juntas pelo espaço, é inevitável não sentir a dor da solidão e consequentemente de uma morte lenta e sufocante quando avistamos tudo aquilo e olhamos nos olhos fundos marcados por uma maquiagem pesada.

 

A fatídica trilha sonora, construída ao vivo pelos próprios atores, provoca arrepios intermitentes ao contrastar com a belíssima iluminação e a sutil idealização dos poucos objetos de cena. 

 

No geral, “Adubo” não só fala sobre a morte, mas como é a própria em busca de entendimento. Uma criação fantástica, repleta de existência e que merecia estar sempre em cartaz ou ser passada adiante para que novos “corpos” levantassem de seus túmulos, e gritassem bem alto sobre os erros que estamos cometendo. 

 

Peça Adubo ou A sutil arte de escoar pelo ralo

Temporada de 24/05/2014 Até 08/06/2014 na Caixa Cultural - Teatro de Arena
Por D. S. Gravelli

 

* Independente das críticas profissionais, sugerimos que assista aos espetáculos e faça suas próprias críticas.
* Acesse a e veja também a opinião do público geral nos comentários.

 

 

 

Quem casa quer casa ou quer sexo?
Essa e muitas outras perguntas são respondidas por Carlos Simões e Drika Matos na peça "Os homens querem casar e as mulheres querem sexo", ou pelo menos eles tenta...
3 Vezes Clara
O Rio no Teatro foi conferir o espetáculo teatral "Deixa Clarear" e o que pudemos constatar é que se trata de um excelente musical na qual a imortal Clara Nunes é ...
Utopia, até onde é bom?
Imaginem um país onde existam poucas leis, e que essas leis sejam simples, básicas e de fácil compreensão. Imaginou? Então, a peça Utopia D - 500 anos d...
A Celebração do Homem
A celebração do homem   Tem toda a razão aquele que diz que “A descoberta das Américas” é um dos melhores espetáculos ...
PUBLICIDADE
RNT - ANUNCIE AQUI
Pescadores de Almas: Arte da Alma
Pescadores de Almas é inspirado na biografia da médium Walkiria Kaminski. O monólogo relata o contato mediúnico e a experiência do suic&iacut...
YANK | Hugo Bonemer interpreta um correspondente de guerra em musical que trata da homoafetividade na 2ª Guerra Mundial.
Depois de interpretar o personagem Augusto, na primeira fase da novela “A Lei do Amor”, da Rede Globo, Hugo Bonemer está nos preparativos finais para viver o personagem Stu, u...
Clássico Romeu e Julieta de volta à programação teatral carioca em ótima montagem
“um nome para romeu e julieta” é a versão adaptada e dirigida por Dani Lossant para o original de William Shakespeare. A montagem, que tem Andrêas Gatto, Daniel C...
Para ver muitas vezes e aplaudir sempre!
“Estamira – Beira do Mundo”, que foi a sensação do teatro carioca entre 2011 e 2012, está de novo em cartaz para a beleza da programação da c...
PUBLICIDADE
Não Vamos Pagar - Comédia imperdível!
Comédia imperdível! “Não vamos pagar” é uma deliciosa comédia que está em cartaz no Teatro do Sesi, no centro do Rio, até 14 ...
O detalhe que constrói o sucesso
Se o teatro pudesse ser comparado a uma casa, o lugar onde Guilherme Leme e Jô Bilac moram seriam aquelas casas cheias de bibelôs e toalhas de crochet, pratos pendurados na parede, p...
Novidades no WhatsAPp
Novidades direto do seu WhatsApp
PUBLICIDADE
FACEBOOK
PUBLICIDADE